Petrarca e as metáforas animais como recurso vexatório

Autores

  • Bianca Fanelli Morganti Universidade Federal de São Paulo

DOI:

https://doi.org/10.11606/issn.2358-3150.v0i13p93-114

Palavras-chave:

Petrarca, invectivas, metáforas, bestiário, retórica, vitupério

Resumo

Ao longo dos quatro livros das Invective contra medicum, Petrarca emprega uma ampla gama de metáforas animais a fim de denegrir seu adversário. A obra, escrita entre os anos de 1352 e 1355, foi, de acordo com o poeta, destinada a um anônimo médico da corte papal de Clemente VI e era uma resposta ao violento ataque que lhe fora desferido por este homem, que parece ter ficado ofendido com algumas afirmações feitas por Petrarca em uma carta enviada ao papa pouco tempo antes. Por intermédio de duras críticas à dialética, estas invectivas promovem um ataque ainda mais forte contra a “mecânica” arte da medicina, que encerra, por sua vez, uma mais ampla batalha contra um numeroso conjunto de intelectuais reunidos pelo poeta no grupo dos magistri artium dos mais renomados centros escolásticos de sua época. A linguagem crua e violenta destas invectivas é pressuposta pelas convenções do gênero e são tomadas dos seus modelos, latinos e cristãos, manifestamente evocados por Petrarca. O poeta não poupa seu adversário de um ataque pessoal, e o compara com um ávido cão incapaz de controlar seus apetites, tal como mencionado por Sêneca em uma carta a Lucílio. Numa evocação às Verrinas de Cícero, o médico é então descrito como um porco, e é também representado como um asno saído do livro de Apuleio. Também as Sagradas Escrituras fornecem a ele um amplo repertório de imagens bestiais, como a da traiçoeira e venenosa cobra ou a da mal-cheirosa poupa que se alimenta de excrementos e restos humanos. Dessa maneira, Petrarca mobiliza um largo bestiário para reprovar o estilo de vida do médico, seus hábitos e práticas, e assim denegrir a sua imagem. Inversamente, o poeta compara a si próprio com um animal uma única vez, o leão, num esforço manifesto de produzir uma imagem positiva do orador, contraposta àquela do médico. Sob a alegoria desses símiles vexatórios, Petrarca pressupõe todo um sistema de sentidos consolidado por um extenso e difundido costume poético, e cristalizado por um vasto conjunto de comentários e exegeses. Este artigo pretende perseguir essas comparações vituperativas, os sentidos implicados nessas metáforas para a prática do discurso petrarquista e, mais especificamente, para a economia argumentativa dessas invectivas contra o médico do Papa.

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Publicado

2009-12-19

Edição

Seção

Artigos

Como Citar

Morganti, B. F. (2009). Petrarca e as metáforas animais como recurso vexatório. Letras Clássicas, 13, 93-114. https://doi.org/10.11606/issn.2358-3150.v0i13p93-114