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Sat, 22 Feb 2025 in Comunicação & Educação
Formação em jornalismo: implicações educativas e reverberações psicossociais
Resumo
O presente estudo procura problematizar um projeto de extensão desenvolvido em um curso de graduação em Jornalismo, com vistas a discutir o processo de formação profissional na área. O projeto contemplou a cobertura da desinstitucionalização de um hospital psiquiátrico, percurso que demonstrou como a construção da cobertura, e concomitantemente de formação universitária, convocou questões de ordem ética e política. Por meio de uma abordagem etnográfica, discute-se a escolha e a definição de fontes, o percurso desenvolvido e as implicações do jogo de visibilidade/invisibilidade na produção do projeto de extensão, indicando implicações para o campo da formação em jornalismo.
Main Text
1. INTRODUÇÃO
Na circulação de verdades do nosso tempo, o Jornalismo ocupa lugar privilegiado. Como tecnologia do imaginário1, ele intervém no cotidiano, modulando afetos e comportamentos, compondo parte importante de uma sociedade que, como Bauman2 destaca, é confessional, ou seja, marcada pela exteriorização da intimidade em prol do reconhecimento e da visibilidade. Diante do dito e do não dito, da voz de uns e do silenciamento de outros, o Jornalismo opera modos de sentir, compreender e agir, interferindo no cotidiano e nos valores sociais, conferindo visibilidade ou aniquilação de assuntos, amplificando alguns fenômenos enquanto outros caem no ostracismo. Considerando esse lugar estratégico que o Jornalismo ocupa, tem-se pensado de que maneira ele se posiciona diante das transformações sociais e, por consequência, como a formação de futuros profissionais na área tem sido promovida.
Dalmolin, Almeida e Silveira3, em revisão acerca da formação universitária em Jornalismo no Brasil - contemplando as Diretrizes Curriculares Nacionais e os Projetos Pedagógicos das universidades - percebem dois paradigmas coexistentes: o informacional e o relacional. Enquanto para o primeiro a formação teria por propósito instrumentalizar a produção de conteúdo, a partir de uma lógica econômico-capitalista, o segundo dedicar-se-ia à construção de narrativas tendo como base a participação social. Ainda que o eixo transversal na formação brasileira, identificado no estudo supracitado, seja a defesa de uma formação alicerçada em fundamentos democráticos, a ambiguidade dos dois paradigmas no panorama nacional nos remete a uma série de questionamentos, ao que retomamos Caldas4:
Qual é o papel do comunicador como sujeito privilegiado na construção do imaginário social? Em que medida é inadiável o jornalista, o “historiador do cotidiano”, o “contador da história imediata” pensar e refletir sobre a informação como instrumento de poder e, ao mesmo tempo, de transformação social? Como discutir ética, moral, valores na sala de aula, no processo de formação do profissional da mídia? (p. 91)
Considerando a explícita (e necessária) demanda ética e política que mora na formação profissional, cujas perguntas anteriormente elencadas servem de lembrete, e tendo em vista que o processo de ensino e aprendizagem envolve o que Paulo Freire indicaria como um movimento dialógico e crítico na formação dos sujeitos5, parece coerente uma formação cuja experiência seja oposta a “consensos fabricados”6. Na esteira dessa discussão, o presente estudo procura problematizar um projeto de extensão desenvolvido em uma universidade do sul do Brasil, no qual se realizou a cobertura jornalística do processo de desinstitucionalização do Hospital Psiquiátrico São Pedro (HPSP), de Porto Alegre, que estava em vias de encaminhar para residenciais terapêuticos seus últimos 16 internos residentes. A temática escolhida para o projeto, como será indicado posteriormente, coaduna-se com a demanda ética e política inerente à situação de desinstitucionalização da loucura - aspecto desafiador para o grupo de estudantes participantes.
Cabe lembrar que a loucura é compreendida, comumente, como ausência de saúde, associada ao imperativo da medicalização, da contenção, ajustamento e sanção normativa7. Sua segregação, como higienização social que está a serviço de produzir e separar o normal do anormal - seres produtivos de pessoas consideradas incapazes, os que valem dos que constrangem - envolve estigmas históricos que se reiteram na contemporaneidade. Ainda que tenhamos marcos importantes para uma leitura mais equânime, como a Reforma Psiquiátrica, os Direito Humanos e a Constituição Federal de 1988, vemos que a construção de cidadania, na interface com a saúde mental, continua sendo um projeto.
Não por acaso o HPSP foi escolhido como local de incursão da experiência educativa, já que é um marco há quase 140 anos, sendo o primeiro e o maior hospital psiquiátrico da região. Alicerçados no processo de construção do projeto de extensão procurou-se analisar a cobertura jornalística desenvolvida, tensionando escolhas e encaminhamentos editoriais, refletindo sobre falas e silenciamentos e indicando aspectos que contribuem para pensar a formação em Jornalismo, tanto quanto as implicações psicossociais sobre a loucura. No intuito de explicitar as implicações envolvidas, a seguir serão apresentados aspectos relativos à formação em comunicação e, posteriormente, às implicações sociais da desinstitucionalização da loucura.
1.1. O discurso jornalístico e a formação em comunicação
O campo midiático promove ou interdita valendo-se do poder do discurso, da veiculação, da visibilidade e, portanto, da produção de legitimidade. Antes entendido meramente como instância transmissionista, hoje é sabido que não ocupa esse modesto papel nas engrenagens sociais. Tal área, na escolha das fontes, na definição de protagonistas, é produtora do que a literatura aponta como “efeito da realidade”8. Para além dos interlocutores (fontes), à mídia cabe o recorte da abordagem, o momento da veiculação, a mediação da voz (quando abre para participação da audiência) e, inclusive, o silenciamento de pautas. E é nessa disputadíssima esteira sobre o conceito de verdade (compreendida não como discurso neutro, mas sim sujeita aos jogos de força que perpassam o espaço social) que se faz possível compreender o valor da notícia, do noticiado, do notório na contramão do invisível.
Da mesma maneira que o Jornalismo pode compor-se como fonte importante de liberação social, reivindicação popular e atuação em prol da garantia de direitos - dada sua abrangência e poder -, ele também pode ser utilizado de maneira eticamente questionável na medida em que participa da construção de imaginários, institucionaliza a representação de um real, por vezes interpretado como uníssono, no que Marcondes Filho9 intitularia “ideologia da transparência”. Na crítica a essa perspectiva Traquina10 alega que a notícia não espelha a realidade, mas ajuda a constitui-la como fenômeno compartilhado, dando forma e viabilizando à existência do próprio acontecimento. Bourdieu11 chama, a isso que Traquina critica, de “processo de naturalização”: o modo que a imprensa escolhe interlocutores, edita falas, denota fontes relevantes, ouve uns, silencia outros sob a égide da técnica.
Esse processo de construção é importante quando colocamos em pauta o jornalismo informativo. Benetti e Jacks12 afirmam que esse é um “gênero supostamente não contaminado pela opinião, pela valoração e pela ideologia”, definindo “a si mesmo como imparcial e isento”, o que “não poderia ser diferente, já que o que está em jogo é sua credibilidade, seu capital, aquilo que lhe confere valor”. Esse campo problemático põe em questão que a ausência de complexidade, tensionamento e abertura que pode existir em certas formas de Jornalismo é um problema ético e político - compreendo ética como uma relação de cuidado consigo e com os outros, e por política o aspecto inerente que é ter a vida em coletividade (na pólis).
Trata-se de algo notório, na esteira dessa discussão, que algumas zonas críticas são viscerais para a atuação na área (e na formação em Jornalismo), remetendo a problemáticas ético-políticas. Para Cornu13, algumas zonas são: a negligência em certificar as informações coletadas, em função de uma lógica de tempo mercadológico; a relação complexa entre liberdade de expressão e liberdade de imprensa; as formas de espetacularização das narrativas em função da audiência; a violação da privacidade e a exploração da violência. A formação profissional no Jornalismo se relaciona a essas questões, especialmente em um momento histórico em que a categoria é atravessada por outros produtores de conteúdo.
Nesse aspecto, a produção de experiências formativas que coloquem as/os estudantes diante de problemas éticos e políticos dessa ordem pode conscientizar e sensibilizar para uma responsabilidade social. Refletir sobre as escolhas, recortes e interpretações jornalísticas é fundamental, mas, para além, colocar em análise o processo de formação na área é ponto crucial para a garantia da construção de uma categoria profissional cada vez mais conectada com as demandas do contemporâneo - especialmente quando elencamos temáticas delicadas e necessárias como a saúde mental, que sofreu profundas transformações com o passar do tempo histórico.
1.2. A desinstitucionalização da loucura como objeto jornalístico
Quando Michel Foucault escreveu História da Loucura embasou seu entendimento no impacto do domínio da razão frente à desrazão - que submeteu a loucura ao exílio e, tão logo, à tortura. A construção da noção de razão se fortaleceu, portanto, às custas do silêncio da desrazão, que recebeu vários nomes em diferentes tempos históricos (leproso, louco, demenciado, doente mental). No século XIX, em especial, se constituem os fundamentos científicos e as terapêuticas relacionadas a essa racionalidade, que se amparam na compreensão de que o sujeito da loucura é um desajustado e que sua correção é uma necessidade.
Essa história tem um percurso árduo em território brasileiro. Ainda no período do Império (anos 1830), por exemplo, via-se a assistência à saúde dessa população ocorrer por via da Igreja e de hospitais14. Saídos das prisões e das ruas, os loucos eram acolhidos nas enfermarias das Santas Casas de Misericórdia, de modo que na organização porto-alegrense se reservou o lugar de “Asylo dos Alienados”. Esse movimento sofre algum grau de mudança na República Velha (1889-1930), cujo pensamento liberal e a força do trabalho procura centralizar o poder no governo. Sendo assim, o louco não deveria mais transitar pelas ruas, pois perturbaria a ordem social - o que justificava o grande investimento psiquiátrico. Nessa conjuntura que se deu a criação, em 29 de junho de 1884, do Hospício São Pedro.
Trata-se de um período histórico cuja influência do pensamento eugenista se mostra explícito. A fundação, em 1923, da Liga Brasileira de Higiene Mental reforça o imperativo idealista de uma classe médica que estruturou todo um sistema de engrenagens no tratamento da saúde pública, e em especial a psiquiatria no tratamento da loucura. Enquanto, no Governo Provisório de 1930, assistimos ao processo de implantação do Ministério da Educação e Saúde Pública, no período Constitucionalista vemos nascer medidas e leis tais como o Decreto nº. 24.559, em 1934, que dispõe sobre a assistência e proteção à pessoa e aos bens dos “psicopatas”, e o surgimento, em 1938, do primeiro Conselho Nacional de Serviço Social.
Em 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU) e a inauguração da Organização Mundial da Saúde (OMS), vão se abrindo espaços para uma longa transformação do entendimento da saúde mental, que aparece explícita em exemplos como da Reforma Psiquiátrica. No Brasil, esse processo ganha força na década de 1970, por meio de reflexões entre profissionais da saúde e sociedade sobre o acompanhamento e tratamento em saúde mental, propondo a desconstrução e a desinstitucionalização das práticas manicomiais e a elaboração de um modelo de atenção psicossocial15 - ou seja, no contraponto às intervenções de cunho eugenista anteriormente deflagradas.
Em 1990, a Declaração de Caracas também se coloca como marco, propondo a superação do modelo hospitalocêntrico, a humanização dos hospitais e a ampliação dos direitos de usuários. Na esteira do movimento, no Brasil, aconteceu a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), que tem como princípios básicos a universalização, a integralidade e a hierarquização das ações, garantindo a todos os indivíduos o acesso à saúde seguindo os preceitos firmados na Constituição Federal de 1988. A implantação da rede de assistência extra-hospitalar, a progressiva extinção dos manicômios e a comunicação compulsória das internações involuntárias são demandas que vão aparecendo mais fortemente em nível nacional (com o projeto de Lei n° 3657) e estadual (na primeira lei estadual no país, n° 9.716/92, que determinou a criação de serviços assistenciais de atenção sanitária e social). Somente em 2001 temos um novo marco legal com repercussão nacional, a Lei n° 10.216/2001, que deu novo fôlego à Reforma Psiquiátrica Brasileira.
Esse movimento histórico fala, portanto, de uma modificação paradigmática na ideia de saúde mental: a perspectiva de que não se produz saúde sem ser em liberdade e de que os serviços devem ser horizontalizados e humanizados (abarcando a não centralidade do poder médico no Sistema de Saúde). O Hospital Psiquiátrico São Pedro (HPSP) foi se modificando com esse processo, de modo que, na década de 90 começaram as experiências de ressocialização de ex-internos, assim como a intensificação de intervenções comunitárias. Ao completar 140 anos, o HPSP celebra o encaminhamento para o Serviço Residencial Terapêutico Florescer, na Vila São Pedro, dos últimos pacientes que ainda residiam na ala de moradia. Ainda assim, continua sendo ponto de referência no atendimento em saúde mental, oferecendo programas ambulatoriais, internação, reabilitação por meio dos equipamentos da Oficina Criativa e do Jardim Terapêutico - mudança de paradigma que ressignifica toda uma história.
1.3. Proposta de Estudo
Como demonstrado, tanto é socialmente estratégica a formação em Jornalismo quanto é delicada a história da desinstitucionalização da loucura no Brasil - processo historicamente recente e ainda em construção. Considerando esse quadro analítico, o presente artigo apresenta o acompanhamento da cobertura jornalística desenvolvida sobre a desinstitucionalização no HPSP, tensionando as escolhas e encaminhamentos editoriais, refletindo sobre falas e silenciamentos e indicando aspectos que contribuem para pensar a formação profissional e o registro psicossocial da loucura na sociedade contemporânea.
2. METODOLOGIA
O percurso foi desenvolvido tendo por pressuposto a abordagem etnográfica, alicerçada na observação participante16. A etnografia considera, em especial, que a aproximação e desenvolvimento em campo envolve dedicação exploratória e estranhamento do cotidiano (usualmente tomado como naturalizado). Baseia-se na interação entre quem desenvolve o trabalho investigativo e as pessoas participantes do campo, mas, para além, supõe uma autoanálise que mapeie a história da própria pesquisa - permitindo um processo reflexivo que se vê reiterado em estudos de mesma base metodológica17. Desenvolver, portanto, um mapeamento qualitativo do trabalho é importante, de modo que todo o percurso foi descrito e discutido desde sua concepção.
Na esteira dessa discussão, cabe atentar que o projeto de extensão se inseriu dentro de uma atividade curricular do Curso de Jornalismo, tendo uma professora coordenadora como docente que acompanhou todo o percurso (sendo a primeira autora deste artigo). Para além da professora coordenadora, a equipe de trabalho foi composta por cinco estudantes de comunicação social, todas(os) estagiárias(os) atuantes em redes de comunicação, assim como teve a participação de professoras(es) do Curso (que colaboravam em reuniões semanais no formato de editores-chefes de pauta), ao longo do ano de 2022. A temática foi desenvolvida de forma horizontal, sendo lançada por uma aluna do sexto semestre e acolhida pelo grupo.
Nesse processo, professores(as) tinham o papel de questionar as razões de cada escolha, ajudando a pensar a relevância dos movimentos de construção da cobertura. Como fonte de registro desse percurso construiu-se diários de campo, com base na observação de: 1) visitas ao local; 2) entrevistas com informantes-chave; e 3) rodas de conversa com a equipe editorial. Esse processo de trabalho foi organizado tendo em vista um reconhecimento qualitativo do espaço, de modo que ao grupo de estudantes fosse possível indicar elementos para além da representação clássica do Hospital Psiquiátrico (dando ensejo para uma leitura ativa e crítica do cotidiano). Para além, as entrevistas com informantes-chave se sustentavam na perspectiva de acolher percepções de pessoas com diferentes posições sociais vividas no espaço, assim como memórias de outros momentos históricos da organização, abarcando um possível contraste com a atualidade. Por último, as rodas de conversa foram organizadas tendo em vista que as escolhas editoriais deveriam ser tomadas de modo contínuo e reflexivo - constituindo um espaço de formação para o grupo de estudantes. Esses elementos foram se desenvolvendo considerando possíveis modificações de trajeto (conforme a demanda explicitada no próprio campo etnográfico).
No que concerne às entrevistas, foram escolhidas três fontes iniciais e, ao longo do processo de cobertura, acrescentadas mais duas. O primeiro foi de uma psicóloga e ativista, pioneira na luta antimanicomial no Rio Grande do Sul. Outra fonte foi uma profissional do SUS que estava há mais de 30 anos envolvida com a temática. A terceira foi uma ex-paciente do HPSP, que havia passado por mais de noventa internações e poderia, portanto, demonstrar a vivência complexa dos programas de saúde mental. Por fim, duas profissionais atuantes em um CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) também foram entrevistadas. Após realizarem as gravações, a equipe de jornalismo decupou o material. As entrevistas foram, portanto, editadas e publicadas em formato podcast no Spotify18. Ao todo, foram quatro episódios, sendo o primeiro intitulado “O que é reforma psiquiátrica e o contexto da luta antimanicomial; o segundo, “A desinstitucionalização do Hospital Psiquiátrico São Pedro”; o terceiro episódio nomeado “A história de quem passou por hospitais psiquiátricos de Porto Alegre”; e o quarto, “CAPS, soluções para pessoas em sofrimento mental”.
Cabe atentar que foram observados todos os procedimentos éticos relacionados à Resolução n° 466/2012, incorporando os quatro referenciais básicos da bioética: autonomia, não maleficência, beneficência e justiça. Nesse aspecto, ainda que Secretaria de Saúde tenha autorizado uma entrada no Hospital, seguiu-se a premissa de não identificação de nenhum usuário/a ou profissional envolvido/a sem a devida anuência. Para além, já no contexto de trabalho de campo, gravações no território do Hospital são impedidas pelo Comitê de Ética do Hospital - o que é prontamente aceito pela Equipe. Considerando aspectos politicamente importantes de circulação de informações, tal como vemos em movimentos no Brasil, como a Lei de Acesso à Informação, (Lei n° 12.527/201119) e a Lei Geral de Proteção de Dados, (Lei n° 13.709/201820), o projeto continuou - focado então no uso metodológico do diário de campo e das entrevistas que contaram com autorização das pessoas envolvidas.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1. Perguntando ao campo: um passo formativo
Como explicitado anteriormente, o HPSP foi definido como local em função de ser representativo do movimento de desinstitucionalização manicomial. Entender como estava ocorrendo a transição de usuárias(os) para os Residenciais Terapêuticos21, compreender o impacto na vida das pessoas envolvidas e a ressignificação das formas de trabalho foram as questões em pauta. A decisão editorial foi unânime, especialmente por se considerar que o local poderia evidenciar a transformação institucional - embora o grupo não tivesse certeza da desinstitucionalização, como política efetiva, tomada como hipótese jornalística.
O trabalho de campo e as entrevistas realizadas pela equipe foram constituindo algumas problemáticas para o andamento da cobertura. Pode-se considerar que o primeiro ponto de conflito interno ao grupo foi relativo à apropriação teórica/conceitual sobre a pauta em discussão. Muitos termos utilizados pelas entrevistadas, por exemplo, eram desconhecidos pela equipe, de modo que se construiu um glossário explicativo. Entretanto, quando uma aluna sugere à equipe uma leitura mais profunda da temática, experiencia-se resistência de colegas - que não veem sentido em abordar conceitualmente questões psicossociais de saúde mental (proposta vista como exclusivamente acadêmica). A reação do grupo evidenciou certa tensão entre tempo e a energia a ser dedicada ao processo de construção jornalística, de modo que as opiniões se dividiram entre uma parcela minoritária, que entendia a necessidade de contextualização conceitual e psicossocial (no qual a literatura seria tão importante para a boa apreensão do tema quanto o campo empírico) e uma parcela majoritária que compreendia que o campo e as entrevistas deveriam ser priorizados (devido ao tempo que demandaria a articulação literária).
Essa primeira problemática entre estudantes reedita um dos desafios que o jornalismo contemporâneo vem enfrentando: a medida do tempo. Ser rápido, dar o “furo de notícia”, levando o campo midiático a um estatuto ambíguo que, não raro, opta pelo conveniente. No entanto, como ressalta Rüdiger22, a conveniência nem sempre resulta na melhor captura do que se pretendia apurar, de modo que “os profissionais de imprensa, por vezes, professam a filosofia espontânea de que seu trabalho consiste apenas no registro imediato dos fatos e em seu relato empírico para o público”. Rüdiger critica a ausência de reflexão, de aprofundamento e apropriação de repórteres/jornalistas, que se veem em um sistema mercadológico, encurtando o tempo e o espaço de produções, muitas vezes não dando visibilidade para ambiguidades e conflitos inerentes aos acontecimentos.
Ao Jornalismo cabe pluralizar discursos, e para isso se faz necessário não apenas escolher boas fontes, mas saber o que perguntar - bem como desdobrar as respostas em entendimentos aprofundados, abarcando a complexidade dos eventos. Como ressalta Guimarães Rosa, e utilizamos como figura de linguagem, é necessário atenção à “terceira margem do rio”23. É necessária certa pulsão escópica pelo conhecimento, entendimento para que se possa compreender, escrutinar algo. No percurso realizado pelos jornalistas em formação, alguns elementos indicavam essa “terceira margem”, como possibilidade de elaboração de boas perguntas analíticas. Vejamos:
Enquanto as/os estudantes finalizavam a única entrevista com uma paciente interna há 34 anos, a coordenadora de um dos serviços internos ao Hospital, que tinha sido chamada com urgência, retorna ao local e me pede para que deletem a gravação de áudio que estavam realizando. Seu nervosismo era visível. Ela conta que o Comitê de Ética informou que não estava autorizada a gravação e tampouco a comunicação com internos. Confirmo que nenhum material privado será divulgado e oriento o grupo a acatar a instrução institucional. O grupo de estudantes se mostra desorientado e decepcionado. Nesse momento, outra profissional é chamada e fica visível o alívio da coordenadora, que enuncia: “Graças à Deus, tu chegaste”. Enquanto os alunos seguem a coordenadora para fazer imagens no local, eu caminho pelo Hospital com a profissional recém-chegada. “Um campo de forças opera sob nossos corpos aqui”, desabafa a funcionária do SUS (Diário de Campo, 2022).
A observação de campo indicava possíveis tensionamentos, por exemplo, entre Secretaria Estadual de Saúde e HPSP. Ainda que a autorização para a visita tenha cabido à Secretaria, de modo que sua assessora de comunicação não apenas havia liberado a entrada do grupo como o acompanhava ao longo da visitação, a ação sumária do Comitê de Ética do local impediu o seguimento. De um lado, a receptividade para o registro imediato (Secretaria de Saúde); de outro, o silenciamento (HPSP). Em meio a isso, um “campo de forças”, composto por certo grau de silêncio.
Power-Carter24 explica que um espaço poderoso advém desses silêncios sob a forma de comunicação. Na esteira dessa discussão, Nadai, Cesar e Veiga25, em “Caminhos para etnografar o silêncio”, descrevem que “o ato de silenciar comunica aquilo que se evita fazer, aquilo que não se vê, não se diz, não se escuta e não pode ser preenchido, além de modelar mutuamente o que se verbaliza” (p. 844). Não por acaso, de todos que a equipe de jornalistas em formação encontrou no local, apenas a profissional que havia chegado depois esteve falante, comunicando o que se passava. Os demais, assombrados, pareciam desviar de uma possível entrevista.
Explico ao grupo que estaríamos vivendo o próprio sintoma da instituição e que seria preciso entrevistar a profissional disponível a respeito, pois ela teria muito a dizer sobre a posição do Comitê de Ética do Hospital. Participo da entrevista, organizada por uma das alunas. A profissional fala sobre interesses políticos e econômicos da atual gestão, sobre a necessidade de criar parceria com a rede de saúde (SUS) como forma de garantir que não haveria retrocessos na desinstitucionalização. A pauta ganha corpo e vivacidade, uma oportunidade de explicitar que algo se operava na organização. Para o grupo de futuros profissionais, entretanto, mantinha-se uma vívida experiência de frustração ao não poderem gravar os internos como imaginavam (Diário de Campo, 2022).
Após a interdição no HPSP, nenhuma comunicação foi possível. O grupo tentou contato com o Comitê de Ética, não obtendo resposta até o final do projeto. Ainda que a situação remetesse ao processo de cuidado institucional com a proteção de imagem de pessoas vivendo sob tutela estatal, a equipe de estudantes se fixava em não poder utilizar o material gravado com os usuários, se mostrando desconcertada. Os sintomas mais visíveis: ausências na disciplina e falta de ânimo para propor outros encaminhamentos. Dada a conjuntura, um professor sugere que o grupo utilize o material em uma narrativa literária, alterando nomes, mas descrevendo o ocorrido - mas nem mesmo isso faz o ímpeto dos futuros repórteres se intensificar. Um dos estudantes cumpre a tarefa de redigir em formato literário, detalhando situações ocorridas na data da cobertura, publicando em novembro de 2022 no site do projeto26.
Recuar é, acima de tudo, uma forma de autopreservação. Frente à sensação de fracasso na visita ao HPSP o grupo se desarticula, sente-se frustrado, sem forças para encontrar uma saída. As atitudes posteriores ao episódio da cobertura operam como um silêncio constitutivo, como define Orlandi27 “ou seja, a parte do sentido que necessariamente se sacrifica, se apaga” (p. 49). Diante da sensação de perda do “objeto” está também a sensação de perda de “poder” do grupo. A interdição do Comitê de Ética impedia falas e imagens de pacientes, mas será que invalidava e desapropriava a capacidade do fazer jornalístico?
A falta de conhecimento histórico e teórico sobre o assunto fazia com que o grupo perdesse oportunidades de indagação, tais como: por qual motivo um local que se propõe à desinstitucionalização da loucura mantém silenciamentos? Qual o temor da gestão do local? Quais os medos, anseios das profissionais no Hospital? Qual o interesse da assessoria do governo ao abrir o campo hospitalar para alunos/repórteres? O que desejam divulgar? Quais possíveis interesses (políticos, econômicos) circundam a esfera da transferência dos internos para Residenciais Terapêuticos? O que acontecerá com o Hospital, em área valorizada da cidade, após a total desinstitucionalização? Desinstitucionalização é equivalente ao esvaziamento do Hospital, ou seriam as práticas do local a grande questão?
3.2. A “fonte-ouro”: transitando entre questões éticas e seus efeitos políticos
O grupo ainda tinha três semanas de cobertura, mas se via paralisado diante da ausência de respostas do Hospital - ainda centrados na possibilidade de gravação dos usuários. Nesse período, professores/editores resolvem fazer uma reunião para acompanhamento dos projetos da disciplina, ocasião na qual o grupo de estudantes retoma a interdição ocorrida no HPSP e o impasse de por onde seguir trabalhando. Na reunião ocorre a um dos professores que a equipe não estaria ouvindo a “fonte ouro”, já que, segundo ele, devia-se escutar o psiquiatra - quem promoveria ou não a alta de um paciente. Se instaura um novo problema: alguns estudantes entendem que o foco da proposta era falar sobre a possibilidade de tratamento humanizado, considerando que a leitura antimanicomial se comporia também com uma organização horizontalizada entre profissionais da saúde - de modo que o poder da figura médica parecia uma questão periférica. Outros se veem convocados pelo editor:
“Vocês deveriam saber que é o médico quem assina a alta. Se ele não é importante, quem é importante no processo?”, dizia o editor. Parte do grupo de estudantes compreende que ouvir diferentes profissionais seria mais importante, de modo que a discussão transita pela possibilidade de escuta multidisciplinar - mas termina em indecisão. Dada a crise instaurada, estudantes procuram professores, demonstrando medo de perder nota semestral por não ouvir a “fonte ouro”. Contatam novamente o Hospital, dessa vez para atender à cobrança editorial, sem retorno - fazendo com que o grupo cogite ouvir qualquer psiquiatra acerca da temática (Diário de Campo, 2022).
Como pondera Mariani28, “por contribuir na construção das evidências, a imprensa atua na naturalização e institucionalização dos sentidos, apagando alguns processos históricos em detrimento de outros […] o que para o leitor comum passa desapercebido”. Ao “naturalizar” processos editoriais e querer crer que haja apenas uma área ou um profissional capaz de explicar, empodera-se esse campo de um notório saber (quer por uma legislação vigente, quer por uma sobrevalorização editorial). Portanto, chamar o médico de “fonte ouro” (desde o ponto de vista do tratamento humanizado e antimanicomial) é seguir com a aposta de um imaginário em que a medicina é figura acima das demais. Tem-se nessa figura a posição de fonte que balizaria o discurso jornalístico e funcionaria como um valor-notícia, substantivo de notoriedade. Assim, na ânsia de valer-se da autoridade maior, rejeita-se ou se estabelece forte hierarquia em relação ao porteiro, à enfermeira, à fisioterapeuta, à camareira, à psicóloga, ao segurança, à atendente como relevantes para contar uma história. Aliança-se com o “poder”, sob o pretexto de escolha da melhor fonte a respeito do assunto - mas se caminha na contramão da proposta do sistema humanizado em saúde.
Na tentativa de produzir uma mudança de percurso, um dos estudantes decide decupar um material gravado com uma ex-paciente do HPSP. Escutando as falas, ele percebe que algo importante não havia sido discutido: a ex-usuária acusava uma funcionária do Hospital de assédio, contando que era vítima de situações em que, por exemplo, lhe fazia perguntas como: “Com o que vocês gostariam de se cortar hoje?”. A gravidade da narrativa instaura um novo desafio aos estudantes: publicar ou não o conteúdo?
Em reunião, um dos professores sinaliza que é fundamental avaliar que a fonte foi internada mais de 90 vezes e que, portanto, talvez não estivesse com suas capacidades mentais preservadas durante o ocorrido. O estudante questiona se é possível ter certeza sobre a sanidade de cada fonte, ao que o professor/editor responde validando a fala do aluno, mas dizendo que não concorda com a publicação, pois “seria especulação”. Comento que deixaram passar a oportunidade, durante a entrevista, de questionar quando o fato se deu, quem era a funcionária e se haviam outras pessoas no local para que se pudessem buscar evidências. Por outro lado, falo discordar da interdição de uma publicação. A especulação jamais será bem-vinda no jornalismo, assim como a aniquilação imediata do que se precisa investigar (Diário de Campo, 2022).
Trata-se de algo notório, diante da história da loucura, que parte da segregação e invalidação existencial do sujeito passe pela ausência de credibilidade. O discurso clássico sobre a loucura a constrói como um quase-objeto, fechado em si próprio29. Encontramos, aí, uma aporia dentro das condições de circularidade discursiva, isto é, das possibilidades de viabilidade ou interdição de um discurso. Nessa perspectiva que Foucault detalha que o que se diz sobre o indigenciado é uma anulação da sua alteridade discursiva; o exemplo do anti-discurso que advém ao próprio louco é significativo para demonstrarmos aqui, em forma de hipérbole, como a indigenciação é, especialmente, a interdição de uma narrativa corporificada e situacional. Cabe perguntar: um atestado de faculdades mentais deve ser prerrogativa para dar ou retirar o crédito de uma citação?
Um inquietante problema para a imprensa, colocada em fronteiras éticas que remetem tanto ao desejo de uma sociedade livre e equânime, quanto a dogmas instituídos que fazem nossa cultura apedrejar o complexo. Nesse momento do processo editorial pesa no grupo a experiência efetiva e ambígua que a loucura instaura: associação da loucura a uma pessoa sem capacidade de responsabilizar-se pelo que sente, diz ou faz e, por outro lado, o desconforto da denúncia e o senso de responsabilidade política para com uma minoria. Como Foucault30 destaca, “é preciso admitir um jogo complexo e instável em que o discurso pode ser, ao mesmo tempo, instrumento e efeito de poder, e também obstáculo, escora, ponto de resistência e ponto de partida de uma estratégia oposta” (p. 96). A questão formativa que se coloca nesse momento ensina, de maneira visceral, que o discurso não é uma instância fora do corpo, mas nos atravessa. Seria necessário perguntar-se se tal desinteresse decorreria da “intangibilidade” do fenômeno: por sua “localização imprecisa”, pela “volatilidade” da presença dos seus sujeitos, pelo seu aspecto “ficcional” absurdo, por tipo característico da alienação” 31.
3.3. A guisa de conclusões: pela cobertura de um futuro livre
Na angústia de talvez estar reiterando o lugar do “indigente” dentro de uma lógica estereotipada, o grupo de estudantes parece carecer de um outro-discurso, um lado pouco visto ou explorado quando a tônica é a sombra manicomial. Diante dessa necessidade, uma escolha se faz presente nas reuniões dos estudantes: o CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) é visto como possibilidade de troca, fala, registro, emergindo como abordagem viável para discutir as possibilidades de tratamento em liberdade. Os CAPS fazem parte da RAPS (Rede de Atenção Psicossocial), do Sistema Único de Saúde. Sendo locais que atuam em caráter aberto e comunitário, se mostram a antítese do que eram os manicômios clássicos (marcados pela exclusão e isolamento), constituídos em equipes multiprofissionais e atuando de maneira interdisciplinar. São espaços nos quais se realiza, prioritariamente, atendimento às pessoas em sofrimento mental, dividindo-se em ênfases/populações, fazendo ocorrer o processo de inclusão da luta antimanicomial. Todas as unidades têm como premissa o estabelecimento de laços sociais e fortalecimento de projetos de vida, ainda que possuam particularidades para uma relação mais orgânica com a própria organização das cidades e comunidades32.
Como um dos produtos desejados pela equipe era a construção de um minidocumentário, o afã pela produção imagética continuava a figurar no grupo. Por isso, entrou-se em contato com diversas unidades desejando a produção de filmagens com usuários. O resultado não foi positivo: as equipes locais indicaram falta de profissionais para dar o suporte no momento da visita, impossibilidade de gravar usuários por falta de autorização, negativas de chefias que não se dispuseram a falar, assim como a necessidade das autorizações das Secretarias da Saúde municipais ou estaduais (aspecto que demandaria, segundo as unidades, de tempo para as devidas autorizações de acompanhamento). A percepção do grupo de que nesses locais a entrada era mais facilitada foi explícita - o que parecia remeter, nos contatos e estudos realizado sobre os CAPS, a uma cultura de abertura mais fortemente instituída.
Entretanto, o tempo disponível para a construção da cobertura estava se extinguindo, o que complexificava aguardar uma nova autorização da Secretaria de Saúde. Dado esse desafio, a equipe se dedicou à realização de mais duas entrevistas, com profissionais de um CAPS do município. Segundo uma das estudantes “por meio dos detalhes que elas traziam, foi possível entender a importância do CAPS para o desenvolvimento de usuários da saúde e a necessidade de um tratamento em liberdade para todas as pessoas”. A decisão de escutar o CAPS como fonte de informação se mostrava, para o grupo de estudantes, de forma singular. Não apenas ficava uma impressão de inviabilidade da sequência da pauta no primeiro local, o HPSP, mas também a necessidade de ancorar o último episódio do podcast e o fechamento da cobertura jornalística com uma “fonte viável”.
Embora o CAPS faça parte da dimensão histórica como um local humanizado, especialmente em comparação aos antigos manicômios, a decisão de seguir por esse caminho diz bem mais do que a escolha de uma saída rápida para a conclusão do projeto. O que não havia sido considerado pelos estudantes, desconhecedores do sistema de saúde antimanicomial, era que esses são serviços ambulatoriais, em contraponto a um serviço de internação hospitalar/asilar com pessoas sob tutela do Estado - em que o Comitê de Ética tem um duplo papel: de proteção do Estado, mas de proteção de usuárias(os)/moradores. Para o grupo de estudantes, parecia que o CAPS abria possibilidades que, supostamente, haviam lhes faltado anteriormente, algo que havia ficado interditado.
Para além, cabem ressalvas também em termos metodológicos. O modelo jornalístico informativo é, sem dúvida, majoritário, mas não único. O grupo poderia ter optado por protagonizar suas próprias vivências profissionais, impedimentos e, com isso, produzir um material crítico capaz de levantar questionamentos, incitar reflexões e não apenas entregar respostas à audiência - utilizando de certo mapeamento dos silenciamentos que aconteceram no Hospital e, também, de suas experiências com uma sensibilidade etnográfica e vivencial. Nesse aspecto, a não utilização de técnicas que colocassem em ênfase questões como interatividade, memória e multimidialidade, como as de storytelling, são uma questão para o processo educativo com o grupo de estudantes.
Por fim cabe ressaltar que, em um movimento de encontrar uma entrada “viável”, balizada no CAPS, a interpretação da equipe de estudantes e professores foi de um “desvio de pauta”. De toda maneira, esse aspecto merece atenção. Uma compreensão do movimento histórico que institui o sistema de atenção em saúde mental demonstra como a desinstitucionalização manicomial se relaciona, intrinsecamente, à formação em rede de unidades de atendimento psicossocial. Nesse sentido, a percepção de um desvio de pauta dizia mais da interpretação do grupo de jornalistas sobre a desinstitucionalização como esvaziamento do manicômio, do que uma leitura efetiva de rede que incluía (mesmo o Hospital) como dispositivo possível de produção de saúde mental.
São escolhas de produção que vão explicitando tanto uma leitura sobre a experiência da loucura e de sua (des)institucionalização, quanto os desafios éticos da profissão. A construção ativa de imaginários se faz, portanto, naquilo que foi possível de registro, mas, também, no silenciamento do que se poderia ter produzido com outras escolhas de cobertura. Afinal, o imaginário “é este estado de espírito que possibilita coesão social”33. Uma espécie de cimento social, de troca por meio das narrativas, das histórias partilhadas, da conexão vivencial registrada e prolongada ao longo dos tempos. Na esteira dessa discussão, e com base na observação realizada, podemos dizer que a cobertura jornalística desenvolvida - a produção, a apuração, a escolha de fontes, a edição e o registro propriamente publicados - incide fortemente na construção de imaginários. A análise de cada processo, tomada de decisão, escolhas, bem como as posturas, os sintomas apresentados pela equipe da cobertura jornalística demonstram alguns dos privilégios e vulnerabilidades da formação e do exercício do Jornalismo.
Resumo
Main Text
1. INTRODUÇÃO
1.1. O discurso jornalístico e a formação em comunicação
1.2. A desinstitucionalização da loucura como objeto jornalístico
1.3. Proposta de Estudo
2. METODOLOGIA
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1. Perguntando ao campo: um passo formativo
3.2. A “fonte-ouro”: transitando entre questões éticas e seus efeitos políticos
3.3. A guisa de conclusões: pela cobertura de um futuro livre
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